Novos acertos: participação popular
- Frederico Aburachid
- 24 de abr. de 2016
- 4 min de leitura
Os desafios atuais do Brasil resgatam sua história desde a velha república. A crise econômica, moral e política despertam, aliadas a grande profusão de informações provocada pela tecnologia, o profundo desejo popular por uma mudança aguda.
Ninguém mais duvida de que as reformas nos campos regulatórios, de gestão governamental e planejamento de políticas públicas são necessárias. Dentre as soluções, indaga-se sobre a viabilidade de uma nova Constituição que melhor balize as condutas dos agentes públicos, além de um novo modelo federativo ou de repartição de competências entre as funções estatais.
Se é bem verdade que a revisão de um texto constitucional ou uma nova assembleia constituinte originária possa promover “rupturas” ou “adaptações”, não é menos certo que a Constituição da República de 1988 erige-se como uma carta programática de Estado que o povo deseja para si e para as suas gerações futuras.
Nesse sentido, antes de se buscar novos paradigmas para a revisão do texto constitucional, a sociedade brasileira precisa aparar as arestas provocadas pela distância entre representantes e representados, restabelecer a crença no sistema político, reafirmar valores sociais, desconstruir ideologias sectarístas (segregatórias) e defender a concretização dos direitos fundamentais estampados na lei maior.
É preciso resgatar valores republicanos que foram esquecidos, reconhecendo-se a força da participação popular nos discursos. Além da mera participação de movimentos sociais, organizações da sociedade civil, entidades sindicais, dentre outras, há de se reconhecer conteúdo decisório e a legítima capacidade de pressão (lobby e outras formas de interlocução), oportunizando os fóruns adequados para se alcançar efetividade e resultados práticos.
Os segmentos da sociedade estão unidos pelo discurso de promoção da dignidade do ser humano e defesa da legitimidade no exercício do poder. Dizem não ao retrocesso e sim ao desenvolvimento sustentável. Há o interesse comum de avanço nas políticas sociais, no desenvolvimento econômico e em uma gestão pública transparente, eficiente e legítima. Todavia, como colocar em prática tal discurso? Como concretizar as ações pretendidas, por exemplo, pela voz das ruas?
Em diversas cidades do mundo, a população já tem tido o reconhecimento de sua força para influenciar substancialmente as decisões governamentais. Não apenas através do voto, mas por monitoramento constante dos atos praticados pelos gestores, conscientizando-se de seu papel na manutenção/execução de projetos que pertencem a sociedade e não aos mandatários do poder isoladamente. A comunidade enxerga-se como autora direta de projetos que são executados pelos governos, os quais respondem aos reclamos da população, comprometem-se a seguir o seu fluxo, ouvir e afinar o tom de seus comandos.
No Brasil, pode-se citar algumas comunidades locais e cidades que tem dado esse exemplo e já irradiam para todo o país seus modelos. Cite-se Maringá/PR e Juiz de Fora/MG.
O município de Maringá, no Estado do Paraná, vem tendo destaque pela governança exercida por seu Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico. Aludido conselho, embora seja órgão integrante da estrutura do Poder Executivo, não sofre controle de subordinação do Chefe do Executivo.
Pelo contrário. A independência decisória do conselho é enaltecida pelas lideranças como forma de legitimar as decisões tomadas pela Prefeitura e que estejam alicerçadas em deliberações colegiadas. Considerada a sua composição, que contempla os mais diversos setores da sociedade, os interesses são colocados na mesa em favor da coletividade e são apartidários. O resultado vem sendo conquistado ano após ano, com o progresso de sua economia, pacificação e harmonia social, planejamento de longo prazo e o controle dos atos da Administração Pública.
Em Juiz de Fora/MG, por sua vez, destaca-se a participação efetiva da iniciativa privada e da sociedade civil organizada como colaboradores no avanço da gestão fiscal municipal. Busca-se, cada vez mais, através da redução das distâncias que normalmente existem entre os cidadãos e o Poder Público, aprimorar a capacitação de agentes públicos, implementar técnicas avançadas de controle das contas públicas, etc.
Naquele município, vem sendo executado o Programa Juntos pelo Desenvolvimento Sustentável, criado pela COMUNITAS, que conclama atores da iniciativa privada, lideranças locais e agentes públicos a estabelecerem um diálogo profícuo pelas causas da cidade. Atribui-se ao programa a ampliação da arrecadação, sem aumento de impostos, além de redução de despesas e outras medidas sociais.
Poderíamos citar vários outros exemplos, como o trabalho desenvolvido pelo Instituto Horizontes (Minas Gerais), com a sua mais recente atuação no vetor oeste da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Dentre outros objetivos, o Instituto Horizontes visa a criação de um Fórum Empresarial Permanente, capaz de contribuir e monitorar projetos de interesse das comunidades locais e que sejam harmônicos entre si.
Todas essas iniciativas demonstram a necessidade de tornar o cidadão e a comunidade na qual está inserido, atores realmente presentes no processo decisório das ações estatais, exercendo fiscalização e controle sobre o exercício da função desempenhada pelo agente público. Os projetos devem surgir das demandas da sociedade, sem estarem atrelados a partidos políticos, nomes de candidatos ou “autoridades messiânicas”. Repensar a participação social no processo decisório das ações estatais é medida que se impõe.
Os problemas do passado continuam a assombrar a vida dos brasileiros. As soluções propostas são, contudo, sempre as mesmas, tornando-nos reincidentes nos erros. Possamos aproveitar a experiência do passado e o conhecimento do presente, na era da informação, para resolver nossos “nós” com propostas que surjam de construções coletivas. É necessário reconhecer às comunidades locais sua capacidade postulatória e decisória. Ao se inovar nas propostas, aprimorando a participação social, talvez se possa encontrar novas respostas, erros diferentes ou novos acertos.
ABURACHID, Frederico José Gervasio. Novos acertos: participação popular. Belo Horizonte: abril/2016.
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